THE DELAGOA BAY COMPANY

Abril 16, 2023

A ÚLTIMA BRAÇADA DE FERNANDO MADEIRA

a semana passada li este breve texto, publicado no jornal desportivo português Record:

O artigo publicado no Record de 9 de Abril de 2023.

Segundo José Freitas, um seu contemporâneo, Fernando Madeira terá sido o melhor nadador português da década de 1950. Do que percebi, trabalhou toda a vida, reformou-se e hoje tem 91 anos de idade. Cometeu o “crime” de, a julgar pelo texto em cima, alugar o apartamento onde ainda vive e desde 1961. E agora, decorrente dos malabrismos da actual lei dos arrendamentos, está a dias de ser despejado do apartamento em Lisboa, que agora é propriedade de uma empresa de investimentos sediada no Luxemburgo, que certamente vai renovar o prédio para vender ou alugar a preços correspondentes.

Fernando Madeira.

Relata José Freitas no sítio Chlorus:

Fernando Madeira, com menos de 10 anos idade, ingressou nas escolas do seu clube de sempre, o Sport Algés e Dafundo.

Estreou-se em competições num festival interno do clube e, diga-se, começou da melhor maneira este início das suas primeiras braçadas a dar nas vistas, com dois triunfos nas distâncias de 33 metros (era o comprimento da piscina) nas técnicas de livres e bruços, com marcas a darem nas vistas aos seus monitores.

A partir desse dia e durante mais de 20 anos, a natação não deixou de estar na primeira linha do seu pensamento. Teve um gosto e uma paixão e de um entusiasmo enorme por este tão saudável desporto.

Teve como seu monitor e treinador o grande responsável por toda a sua evolução, como nadador, homem para uma sociedade melhor, Hermano Patroni, o homem que ensinou meio Portugal a nadar.

A sua estreia competitiva oficial foi em 1947, num ambiente fora do seu clube, na cidade de Coimbra, na piscina flutuante, colocada no Rio Mondego.

O seu entusiasmo pela modalidade foi crescendo. Em maio de 1947, alcançou o seu primeiro recorde de Portugal, este integrado na estafeta de 3×100 estilos, na categoria de iniciados. Teve como parceiros Eduardo Barbeiro (costas), João Bichinho (bruços) e Fernando Madeira (livres).

Nesse ano teve o seu primeiro recorde individual na categoria de iniciados, 100 metros livres (1.08.6).

Madeira era um exemplar nadador, levava tudo a seu último pormenor, na sua constituição física, que lhe proporcionava uma maior facilidade de progredir como nadador exemplar.

Na altura, por ordem da DGS, os nadadores de iniciados, principiantes, por lei não podiam participar em provas que fossem além de 200 metros. Até que na sua primeira competição internacional, com 16 anos, teve que ter uma autorização especial pela DGS para poder participar na prova dos 400 metros livres no encontro internacional entre Espanha e Portugal, realizado em Palma de Maiorca, em 1946.

Neste encontro classificou-se em quarto lugar, com marca de 5.39,1, que lhe valeu os maiores elogios, por parte dos nossos “hermanos” espanhóis. Que viam no jovem nadador, um promissor na natação europeia.

Foi na clássica travessia entre Trafaria e Algés, no ano de 1950, que se assistiu a uma das mais renhidas lutas pela conquista do triunfo na clássica prova, entre o mítico vencedor que era Batista Pereira e o jovem nadador do Algés, este que teve como seu guia o seu treinador Patroni, raposa velha neste tipo de provas, que levou o seu nadador pelo melhor rumo, até a poucos metros da meta, situada mesmo defronte do posto náutico do clube. Triunfo do jovem nadador, pela diferença de 17 segundos, entre os dois nadadores.

Foi a primeira derrota dos conhecidos por “Crocodilos do Tejo”, como eram tratados os nadadores alhandrenses, pelos seus domínios constantes em provas do rio e mar, que era constituída por Batista Pereira, Jofre de Carvalho, Manuel Pinhão e outros.

Nesta prova que também participei, pelo Adicense, a equipa do Algés era composta com a base da sua equipa de juniores: Fernando Madeira, Eduardo Barbeiro, Eurico Perdigão e Ezequiel Gameiro das Neves.

Foi um feito assinalável que premiou e aumentou o entusiasmo dos jovens algesinos para as provas futuras.

Fernando Madeira com Eduardo Barbeiro.

Fernando Madeira foi um autêntico semeador de novas marcas absolutas nacionais. Era uma melhoria constante de novas marcas, desde os 200 metros até aos 1500 metros livres. Superou da lista de recordes o nome de Batista Pereira.

Era uma figura ímpar, tendo sido um dos jovens desportivos eleitos como o melhor do ano 1950. Foi atleta de eleição.

Foi um semear de títulos e recordes, uns atrás de outros desde 1947 e fins de 1958. Somou qualquer coisa como 78 recordes absolutos.

(fim)

Em 1952, representou Portugal nos Jogos Olímpicos de Helsínquia.

Eu, que nadei competitivamente muitos anos depois de Madeira ter arrumado o Speedo na gaveta, estive duas vezes com Fernando Madeira, uma quando era miúdo (entregou-me uma medalha depois de umas provas aqui em Portugal, representava eu Moçambique) e outra num almoço em 2009, cujo relato está neste blogue.

Independentemente das circunstâncias, choca-me ver aquilo por que Fernando Madeira está a passar e espero que se arranje uma solução que permita a esta grande figura da natação portuguesa passar o resto dos seus dias em paz e sossego.

Fontes:

AQUI e AQUI

Março 31, 2023

JOAQUIM BAPTISTA PEREIRA EM ALHANDRA, 1959

Filed under: 1950 anos, Joaquim Baptista Pereira 1959 — ABM @ 9:23 am

Imagem colorida, com vénia para o Diário de Notícias de 8 de Março de 2023.

Joaquim Baptista Pereira foi um nadador português peculiar na medida em que teve uma carreira muito longa, muito diversificada e muito ilustre. Nunca o conheci, apesar de ter nadado em Portugal nos anos 70, depois da Grande Debandada de Moçambique, altura em que ele ainda era recordado – e estava vivo. Parece que vivia em Alhandra, outrora uma localidade idílica e agora um inferno industrial. Dele, eu apenas sabia que ele era comunista e que ele tinha atravessado o Canal da Mancha (em 21 de Agosto de 1954), mais nada. Mas outro dia li um texto sobre o seu percurso e fiquei a pensar sobre como a excelência e a fama de uma pessoa em Portugal valem absolutamente zero. É impressionante.

Mais impressionante a sua especialidade na chamada natação de águas abertas – travessias do Tejo, Estreito de Gibraltar, Canal da Mancha, etc. Tenho uma vaga noção do que isso é. Uma vez, com 14 anos de idade, era eu um nadador de piscina, fui embarrilado para participar na travessia da foz do Rio Sado, de Setúbal para outro lado (na altura havia a Torralta). Foi um horror e jurei que nunca jamais faria uma coisa dessas. Não sei como ele fez tudo o que fez.

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