A propósito de uma longa entrevista que fiz ao Dr. Rui Baptista (RB), que o Tomané transcreveu aqui no blogue “The Delagoa Bay”, cumpre-me tecer alguns considerandos a respeito da si por poderem não ser do conhecimento da generalidade dos leitores.
Tive o privilégio de o conhecer e tornar-me seu amigo ao longo dos anos.
Em minha opinião, RB foi uma das figuras mais carismáticas do Desporto moçambicano, quer como professor, quer como dirigente desportivo, quer, ainda, como comunicador dos ideais que sempre defendeu com marcante empenho e superior conhecimento de causa, seja através de escritos jornalísticos, de conferências, seja, ainda, como praticante de pesos e halteres (Culturismo) em que se sagrou campeão de Moçambique, na categoria de médios.
Por esse facto, ter eu ficado chocado e até revoltado com a sua não nomeação para presidente do Conselho Provincial de Educação Física (CPEF) depois de ter a sua nomeação sido assinada pelo ministro do Ultramar Silva Cunha (faltando apenas ter o visto do Tribunal de Contas, aliás uma questão de escassos dias).
Acresce que a sua nomeação chegou a ser noticiada pelo jornal publicado na cidade da Beira: “Vai ser nomeado presidente do Conselho Provincial de Educação Física de Moçambique Rui ‘Vares’ Baptista”. Assim, tal e qual com a troca de Vasco, seu segundo nome próprio, por “Vares”. Em seu lugar foi nomeado Noronha Feio, vindo da então Metrópole, a quem o Desporto de Moçambique nada de nada devia. Sendo RB à data Inspector de Educação Física Escolar da Mocidade Portuguesa pediu a sua exoneração, tendo recebido um louvor no Boletim Oficial de Moçambique.
Chegou RB a Lourenço Marques em 1957 – depois de formado pelo INEF e ter cumprido o serviço militar como aspirante, alferes e tenente miliciano em Tomar – contratado como professor de Educação Física da “Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque”, tendo desenvolvido, para além dessa docência, um notável acção no desporto local e uma intensa actividade no campo da Ginástica Correctiva com pacientes de Lourenço Marques, alguns deles deslocando-se à África do Sul, a fim de serem consultados pelo mais famoso cirurgião ortopedista, o Dr. David Roux, que indicava o seu nome para os serviços de reabilitação necessários.
No ano a seguir à sua chegada à cidade do Índico (1958) foi convidado para preparador físico dos nadadores laurentinos que se deslocariam à Metrópole para disputarem os Campeonatos Nacionais da modalidade. Em representação do CPEF, foi nomeado chefe da respectiva Embaixada, embora não pertencesse aos quadros do CPEF, mas sim o seu colega Igeménio Tadeu.
Desde sempre, apaixonado pela sua dama, a Educação Física, foi dirigente desportivo e preparador físico de várias modalidades desportivas (basquete, futebol, hóquei em patins, etc.) tendo desenvolvido paralelamente uma acção constante na preparação de várias classes de ginástica do Clube Ferroviário.
Entretanto, teve, também, uma acção importante no campo literário, através da publicação de vários livros no âmbito, por exemplo, dos Pesos e Halteres e da Educação Física como ciência ao serviço da saúde pública. Desempenhou a função de presidente da Secção de Ciências da Sociedade de Estudos de Moçambique, onde proferiu duas conferências no âmbito da Educação Física, tendo entrado, assim, o Desporto e a Educação Física pela porta grande dessa notável instituição cultural e científica.
Em 1975 fez parte do grande contingente de Portugueses que se viram coagidos a deixar Moçambique, onde tinha fixado residência. Foi colocado em Coimbra, como professor efectivo de Educação Física do Liceu D. João III (anos depois, Escola Secundária José Falcão). Foi também docente do ISEF da Universidade do Porto e docente da Faculdade de Educação Física e Ciências do Desporto da Universidade de Coimbra. Na cidade das margens do Mondego continuou a desenvolver uma intensa actividade com artigos de revistas da especialidade, a efectuar conferências e palestras, por exemplo, nos Rotários e na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, a escrever livros e a publicar artigos de opinião nos jornais “Diário de Coimbra”, “Correio da Manhã”, “O Primeiro de Janeiro” e o “Público”. É co-autor do blogue De Rerum Natura, de há tempos para cá. Também em Coimbra desenvolveu uma intensa actividade no campo da Reabilitação Física (de que fora professor no ISEF do Porto) tendo assinado convenções com diversos organismos públicos.
Quase a terminar, e volvendo a um saudoso passado das margens do Índico, como escrevi no início, conheci este Professor, em Lourenço Marques, tendo tido o grato prazer de entrevistá-lo para o jornal “Diário de Lourenço Marques”, a propósito de uma série de entrevistas, “O desporto nas Escolas”, com a participação de uma dúzia de personalidades ligada ao desporto, na sua maioria professores de Educação Física. Desde essa altura, ficámos amigos para todo o sempre, merecendo-me o maior respeito e consideração pela sua humildade, cultura e simpatia, para além do seu incontestado valor profissional, muito lamentando, como tal, a gritante injustiça de não ter sido nomeado, à última hora, presidente do CPEF (quando tudo estava encaminhado nesse sentido) por ele ter sido a personalidade mais bem posicionada para o desempenho desse elevado cargo, sobejamente demonstrado através da sua extrema dedicação ao Desporto Moçambicano.
Sertório da Silveira